Política Internacional
‘Efeito Trump’ fortalece discurso nacionalista de Lula e isola bolsonarismo, avaliam especialistas
Anúncio de tarifa de 50% aos produtos brasileiros pelos EUA amplia narrativa de soberania do governo Lula e fragiliza oposição ao associá-la a interesses estrangeiros
10/07/2025
22:45
DA REDAÇÃO
©ARQUIVO
A imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, abriu espaço para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) resgatar uma retórica nacionalista que vinha enfraquecida na esquerda brasileira. Segundo analistas políticos, o chamado "efeito Trump" pode impulsionar a popularidade de Lula ao colocá-lo como defensor da soberania nacional e posicionar a oposição, sobretudo o bolsonarismo, como alinhada a interesses externos.
O gesto de Trump, que enviou uma carta mencionando diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro e criticando o Supremo Tribunal Federal (STF), foi visto como uma interferência explícita nas relações bilaterais. A estratégia de responsabilizar o governo brasileiro acabou atribuindo à própria família Bolsonaro os prejuízos da medida.
“Trump deu um presente a Lula que deixa a oposição na defensiva pela segunda semana consecutiva”, afirma Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva.
Casos similares ocorreram em países como Canadá, México e Austrália, onde o discurso de soberania frente a investidas de Trump fortaleceu partidos progressistas e seus líderes. No Canadá, a retórica nacionalista levou à vitória do Partido Liberal. No México, a presidente Claudia Sheinbaum conseguiu reverter tarifas sem abrir mão do diálogo com os EUA. Na Austrália, o Partido Trabalhista se recuperou ao confrontar o trumpismo local.
No Brasil, Lula tem aproveitado o momento para fortalecer a narrativa de que a extrema-direita está agindo de forma “entreguista”, colocando os interesses nacionais em segundo plano para atender aliados ideológicos no exterior.
“O governo brasileiro se unifica quando há uma agressão externa. Isso mobiliza setores diversos em defesa do país”, reforça Meirelles.
Aliados de Bolsonaro tentam responsabilizar Lula pelas tarifas, alegando que declarações do presidente na cúpula dos Brics — onde defendeu uma nova moeda para o comércio internacional — teriam motivado Trump. No entanto, a carta americana menciona diretamente Bolsonaro e reforça a narrativa de perseguição judicial contra o ex-presidente, enfraquecendo os argumentos de seus apoiadores.
Para o cientista político Christian Lynch, a esquerda brasileira, antes paralisada em discursos antigos e fragmentados, reencontra agora uma causa mobilizadora. “O nacionalismo era um campo ocupado pela direita. Agora a esquerda retoma esse espaço com um discurso mais forte e popular”, analisa o professor da Uerj.
A narrativa atual remete ao nacionalismo trabalhista de Getúlio Vargas, João Goulart e Leonel Brizola. O historiador Leonardo Weller lembra que o Brasil tem tradição de independência diplomática, e a reação do governo aos EUA ecoa esse histórico.
“É muito difícil justificar que Trump está ajudando o Brasil ao aplicar uma tarifa que prejudica diretamente o agronegócio e a indústria nacional”, pontua Weller, professor da FGV.
Pedro Abramovay, da Open Society Foundations, avalia que a retórica de soberania fortalece o discurso de Lula para 2026. “Trump cometeu um erro político. Ao abrir a carta falando de Bolsonaro, acabou vinculando a família do ex-presidente às sanções comerciais contra o Brasil.”
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