Política Internacional
Ações de Trump contra Brasil deixarão sequelas permanentes, diz ex-subsecretária de Defesa dos EUA
Para Jana Nelson, tarifas e sanções impostas pelo governo norte-americano quebraram a confiança e vão alimentar o antiamericanismo por décadas
18/08/2025
07:30
DA REDAÇÃO
©DIVULGAÇÃO
As medidas adotadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil, incluindo tarifas e sanções, deixarão “sequelas permanentes” na relação bilateral entre os dois países. A avaliação é de Jana Nelson, brasileira-americana que chegou ao alto escalão do governo norte-americano, onde ocupou o cargo de subsecretária de Defesa para o Hemisfério Ocidental até janeiro deste ano.
Segundo ela, houve uma quebra de confiança profunda e de efeitos duradouros, que dificultará a reconstrução das relações mesmo em futuros governos mais abertos ao diálogo.
“Daqui a 20 anos, vão fazer referência ao que está acontecendo hoje, vão dizer: é por isso que não se pode acreditar no que diz o governo americano”, afirmou Nelson em entrevista à Folha.
Nelson, que foi responsável pelas relações com o Brasil no Departamento de Estado por cinco anos, destacou que o uso da International Emergency Economic Powers Act (Ieepa) como justificativa para o tarifaço representa um marco negativo:
Sanções e tarifas passaram a ser utilizadas como instrumento de coerção;
O fim da Usaid e a retórica anti-globalização romperam a tradição americana de defesa do livre comércio;
O cenário reforça a busca por autossuficiência e diversificação econômica por parte do Brasil e de outros países.
Na visão da ex-subsecretária, as medidas de Trump alimentam um antiamericanismo que já era latente no Brasil e que, agora, tende a se consolidar como referência histórica negativa, comparável ao apoio dos EUA ao golpe militar de 1964.
“Vai virar o mesmo tipo de exemplo a ser usado no futuro. É uma pena”, lamentou.
Nelson afirmou que Trump “pegou o Brasil para Cristo” em razão da relação pessoal com o ex-presidente Jair Bolsonaro, a quem enxerga como um aliado que viveu situação semelhante à sua. Ela ressalta, porém, que o fator geopolítico — como a participação do Brasil no Brics e o debate sobre desdolarização — não é prioridade para Trump, que trata o caso de forma mais pessoal.
Apesar do cenário adverso, Nelson aponta que a pressão de empresas privadas norte-americanas pode ser um instrumento de negociação, além de projetos no Congresso dos EUA que buscam limitar o uso da Ieepa como mecanismo de tarifas.
“Talvez em seis meses, quando os efeitos da política tarifária forem sentidos na inflação, congressistas republicanos passem a apoiar limites para a lei”, avaliou.
Nelson alerta que a crise pode acelerar a aproximação do Brasil com a China, mas faz ressalvas:
“Interdependência com os EUA pode ser perigosa, mas a interdependência com a China também é. É preciso evitar que o pêndulo vá demais para Pequim, que tem menos afinidade cultural e de valores.”
Jana Nelson, 41 anos – Nascida em Manaus, filha de americanos, é formada em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília, com mestrado em Georgetown. Atuou no Departamento de Estado (2010-2015), foi assessora na ONU e subsecretária de Defesa dos EUA. Atualmente, dirige a área de América Latina no Instituto Tony Blair, mas fala em caráter pessoal.
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